Olá, pessoal!
Ontem
e hoje¹ foram dias muito marcantes
para mim. Ontem, pela primeira vez em meses eu senti a maravilhosa
sensação de andar novamente, sem precisar de cadeira de rodas ou
muletas. Uau! Que experiência. E isso é só o início. Estou em tempo de
reaprender a andar. Aliás, sobre meus últimos meses, eu sintetizaria com
uma frase do poema Mar Português, de Fernando Pessoa, já citado anteriormente em nosso blog: Tudo vale a pena se a alma não é pequena. Agradeço a todos que de uma forma ou de outra estiveram torcendo por minha recuperação.
Mas, na verdade, estou dando essa passada rápida pelo nosso blog,
para registrar que hoje, durante o crepúsculo vespertino, pude
observar a olho nu o cometa Panstarrs (C/2011 L4), desde a cidade do
Salvador.
Após
o ocaso do Sol, o primeiro astro a surgir foi Júpiter, ao norte do
zênite, com o céu ainda azul claro. Pouco tempo depois foi a vez de
Sírius, bem próximo ao zênite, no sudeste alto. Depois Canópus, mais ao
sul, e Capella, linda, cintilante, ao norte. O oeste estava limpo,
livre de nuvens e com pouca matéria em suspensão no ar. As condições de
observação, apesar da luminosidade da cidade, eram boas.
As silhuetas dos edifícios foram
ganhando janelas luminosas, e ao fundo, os tons vívidos do crepúsculo,
vermelho, laranja e amarelo, aos poucos douravam o ocidente. Acima desse
gradiente encarnado, uma faixa lívida limiava com o derradeiro azul do
dia, quase virado em lilás.
Meu momento favorito do dia, o
crepúsculo vespertino. Fiquei ali, perscrutando o céu a procura de uma
pedrinha de gelo, com cabeleira e cauda. Um raio rosa vazou da região
zodiacal rumo ao zênite, e uma linda luz esverdeada se concentrou no
horizonte oeste. Sobre minha cabeça, no centro da abóboda celeste,
surgiu Rigel (beta orionis), depois Betelgeuse (alfa orionis). Pouco
depois foi a vez de Aldebaran (alfa tauri), que esperei e vi chegar, a
cerca de 4º graus de Júpiter. No oriente, o céu escurecia lentamente
para o tom marinho.
Eu
estava ansioso por ver Deneb Kaitos. Sabia que ela apareceria a
qualquer momento. No sudoeste, Archenar (alfa eridanii) perdia altura...
Então, de repente: - Lá ela! Meus olhos refletiram o
brilho recém chegado de Deneb Kaitos... Linda. Sua luz viajou noventa e
cinco anos pelo "vazio do espaço" até chegar a Salvador. Quem diz que os
astros não influenciam a vida na Terra, nunca se emocionou com uma
estrela.
Pois,
lá estava a Baleia. Agora era uma questão de tempo para ver, ou não, o
Panstarrs. De repente, surgiu uma luminosidade tímida sobre o oeste,
entre as contelações da Baleia e dos Peixes. Mantive-me cético e
analisei: poderia ser a estrela iota ceti? Esperei. Não, não podia ser a
iota ceti, seu brilho é muito débil para ser visto tão próximo do Sol.
Também não era Marte, com certeza. Marte não estava visível. E, por fim,
não poderia ser nenhuma das estrelas de Peixes que situam-se ali, pelo
mesmo motivo que não poderia ser a iota ceti. Não teriam magnitude para
serem vistas tão próximas do Sol. Além disso, desde o início, percebi,
mas me contive, que se tratava de um astro nebuloso.
As condições de luminosidade do céu e
a poluição luminosa da cidade foram
fatores adversos, mas mesmo assim, daquele pequeno e nebuloso astro,
subia uma tênue cauda alongada em oposição ao horizonte. E eu já não
tive mais dúvidas... Era o cometa Panstarrs sobre o horizonte oeste.
Permaneci ali, no alto de onde estava. Podia ver o Atlântico entrando na
noite, e as luzes da cidade se acendendo no ocidente contra os últimos
tons da luz crepuscular. A Terra, girando para o leste, fez o cometa
desaparecer contra as silhuetas dos prédios de Salvador. Linda cauda a
sua, pedrinha que vôa entre as estrelas da Baleia.
Amanhã voltarei a observar e espero
confirmar a observação. Infelizmente, as condições de observação do
Panstarrs em Salvador não são favoráveis. Eu precisei buscar um bom
local de observação
para o oeste, e tive sorte pois as condições atmosféricas ajudaram.
Mas, se eu não conhecesse muito bem essa região do céu, eu não saberia
distinguir o cometa. Por tanto, não se fruste se você tentar e não
conseguir.
No entanto, de Feira de Santana a observação do cometa Panstarrs tende a ser consideravelmente mais fácil do que em Salvador, pois Feira sofre menos poluição luminosa e está mais alta em relação ao mar. Hoje, ao pôr do Sol, acima do horizonte oeste, entre os tons do crepúsculo e os últimos tons de azul do dia, quem estiver em um local propício, com boa vista para o poente, verá surgir um astro tímido e nebuloso cerca de 10º do horizonte.
Quem tiver a vista mais apurada, perceberá a cauda, uma mancha alva, tênue e difusa se alongando em oposição ao horizonte. É uma observação difícil de ser feita sem a orientação presencial de alguem que conheça o céu, se você não reunir as condições necessárias para
fazer esta observação agora, não se preocupe, você terá outras
oportunidades, ainda este ano, especialmente no segundo semestre, quando
está prevista a passagem do cometa Ison. Falaremos mais a respeito, em outro momento.
Uma das primeiras coisas que a
astronomia nos ensina é ter paciência. Antes mesmo de querer sair
comprando um telescópio, você precisa conhecer o céu a olho nu, pois só
assim você saberá para onde apontar seu telescópio, quando tiver um.
Bem, eu passei aqui porque precisava dividir com vocês essa minha observação de hoje.
Um forte abraço a todos!
Fernando
¹Publicado em 09/03/13 no blog EXPLORANDO O CÉU, adaptado e postado pelo autor para o blog Despertar para a Astronomia, no dia 10/09/13.